
Por Delmiro Campos, advogado
O barulho das manchetes sugeriu uma mordaça que nunca existiu. A Segunda Turma do STJ apenas permitiu que uma ação de improbidade seguisse adiante para apurar, naquele caso concreto, possível autopromoção com peças oficiais replicadas em perfil pessoal e desproporção de gastos (REsp 2.175.480/SP, rel. Min. Teodoro Silva Santos). Não há condenação nem nova regra proibitiva.
O caso envolve cerca de R\$ 44 milhões em publicidade — mais de 20% do total de R\$ 190 milhões do programa “Asfalto Novo” — e a replicação de peças institucionais, com slogans e identidade visual da gestão, no perfil pessoal do então prefeito. Somado ao contexto político de 2018, o STJ viu indícios suficientes para apurar dolo e eventual prejuízo ao erário, como prevê a Lei 14.230/2021. É fase inicial: examinam-se indícios, não se impõe silêncio.
Essa decisão não muda o que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) já vem dizendo há tempos. Postagens em perfis pessoais, feitas por conta do gestor, sem usar a máquina pública, são válidas. O problema é quando se usa recursos, símbolos ou canais oficiais para se promover, especialmente nos três meses antes das eleições. O TSE já cravou: se a postagem é pessoal, sem depender da estrutura pública, está liberado. Se mistura o oficial com o pessoal, complica. E, em período eleitoral, a cautela precisa ser redobrada.
Um exemplo útil veio da Bahia. Em maio de 2023, o Tribunal de Contas dos Municípios determinou a retirada de publicações colaborativas entre o perfil oficial da prefeitura de Serra do Ramalho e o perfil pessoal do prefeito, porque a associação direta de brasão, slogan e imagem do gestor transformava comunicação pública em vitrine pessoal (TCM-BA, 1ª Câmara, medida cautelar ratificada em 24/05/2023, rel. Cons. Plínio Carneiro Filho). A ferramenta de “collab” não é ilícita por si; torna-se indevida quando viola a impessoalidade.
Em síntese: o STJ não impôs silêncio a ninguém. O Tribunal deixou claro que, quando a publicidade institucional se mistura ao perfil pessoal, os fatos podem e devem ser analisados com cuidado, levando em conta o alcance real da comunicação e o contexto político.